O teólogo e escritor Franklin Ferreira, autor do livro “Contra a Idolatria do Estado”, fez uma análise sobre o julgamento do ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ao avaliar o chamado “abuso de poder religioso” no âmbito da política.
“Como ficam os abusos de poder partidário, ideológico e filosófico em sindicatos, associações, escolas e universidades, com o objetivo de influenciar eleitores?”, questionou Ferreira em sua rede social.
A principal crítica do teólogo está no fato de que há diferentes tipos de abusos, e não apenas o religioso, de modo que o julgamento da questão fica parecendo uma reação ao crescimento da população evangélica no país. Veja abaixo o texto completo publicado pelo autor:
Semana passada o TSE começou a julgar se cabe a perda de mandato para o candidato que comete abuso de poder religioso.
O ministro Edson Fachin, relator do caso que discute a proposta, menciona em seu voto “as ‘Institutas da Religião Cristã’ (1536-1559), de João Calvino […], ‘A nobreza cristã da nação alemã acerca do melhoramento do Estado’ (1520), de Martinho Lutero, e a ‘Política’ (1603), de Johannes Althusius”. Também menciona a “Declaração Teológica de Barmen” (1934), “resolução […] que orienta os cristãos […alemães] diante da nefasta ideologia do nacional-socialismo”.
Também são mencionados dois documentos em que participei ativamente de sua redação: a “Declaração sobre a Atual Conjuntura sociopolítica da Nação” (10º Congresso de Teologia Vida Nova, 2016) e “Eleições 2018: Carta aberta à Igreja brasileira” (Coalização pelo Evangelho, 2018).
O ministro, a partir dos textos mencionados, reconhece que “o Estado constitucional democrático [tem] raízes religiosas, […] [e que] seria injusto […] excluir a religião da esfera pública numa sociedade pluralista”. Mas também afirma que “no panorama do Estado constitucional, inexistem direitos absolutos, de maneira que a liberdade religiosa […] encontra, por certo, limites em outros direitos fundamentais”. Com isso, o ministro, num non sequitur lógico, conclui: “Venho propor […] que, a partir das Eleições deste ano de 2020, seja assentada a viabilidade do exame jurídico do abuso de poder de autoridade religiosa no âmbito das ações de investigação judicial eleitoral”.
Já são punidos na legislação eleitoral o abuso do poder político, econômico e dos meios de comunicação, assim como propaganda política em templos e a doação financeira a políticos por parte de igrejas. Mas o que se quer, agora, é punir a influência de pastores e líderes evangélicos no processo eleitoral. Tal medida, se aprovada, colocaria na mão de agentes do Estado a avaliação da consciência religiosa – afinal “quem” vai determinar o “que” se constitui como abuso? O Estado, assim, se tornaria juiz da religiosidade e da fé.
Mas como ficam os abusos de poder partidário, ideológico e filosófico em sindicatos, associações, escolas e universidades, com o objetivo de influenciar eleitores?
Fiquemos apenas no exemplo das universidades. Estas se tornaram madraças da esquerda, e são dos poucos lugares onde partidos de extrema-esquerda como o PSOL, o PCdoB e o PCO têm alguma influência. O TSE coibirá nesse ambiente o “voto de cabresto”?
O voto do ministro Fachin ilustra como a esquerda trata o cidadão comum: como uma pessoa incapaz, facilmente influenciada ou enganada. Para estes, o establishment é formado por uma casta de iluminados, que protegem a sociedade da fraqueza do povo em discernir o que é o melhor para suas próprias vidas. Por isso a elite política acha que as pessoas são enganadas por seus líderes religiosos, como se elas não compartilhassem os mesmos valores de fé que seus pastores e igrejas que decidiram seguir e frequentar.
Não custa lembrar que em janeiro de 2020 o ex-presidente Lula – condenado por corrupção, mas solto pelo STF – incentivou a criação de núcleos de “evangélicos progressistas”. Em seu esforço de ocupação de espaços nas igrejas, esquerdistas tentam aparelhar até cerimônia de batismo infantil. Uma eventual decisão do TSE se aplicaria a estes também?
Na verdade, a posição do ministro – que representa o pensamento de parte da elite política – configura abuso do Estado sobre o cidadão.
A previsão dos especialistas é que, mantida a tendência atual de crescimento no número de evangélicos, em 2030 estes cheguem a 40% da população, com os católicos representando menos da metade da população brasileira.
Assim, tal postura mostra que o establishment está claramente preocupado com o crescimento dos evangélicos e sua influência política na sociedade. Como a elite política defende a privatização da fé e despreza as principais pautas éticas cristãs, atuam – supostamente em nome da democracia – para sufocar a voz evangélica na esfera pública, tentando regulamentar o que é dito e feito nos templos evangélicos.
Com isso fica mais fácil aumentar o Estado, dar livre curso à corrupção, destruir a família, impor a ideologia de gênero, aprovar o aborto e silenciar o testemunho público evangélico.
No julgamento do TSE, o ministro Tarcísio Vieira pediu vista e suspendeu a análise da questão.