Em um movimento que coloca em xeque a jurisdição internacional e a liberdade de expressão, a empresa de mídia do ex-presidente dos Estados Unidos Donald Trump e a plataforma de vídeos Rumble ingressaram com uma ação conjunta em um tribunal federal da Flórida contra o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes.
O processo, movido no distrito onde o Rumble está sediado, acusa o magistrado brasileiro de violar a soberania dos EUA, a Constituição americana e as leis do país ao emitir ordens sigilosas que exigem o fechamento de contas e a entrega de dados de usuários.
As ordens em questão, emitidas por Moraes, determinam o bloqueio da conta do influenciador bolsonarista Allan dos Santos na plataforma Rumble e a divulgação de seus dados pessoais. Tais medidas, segundo as empresas, foram impostas de forma sigilosa e proíbem a divulgação de seu conteúdo, o que, para elas, configura uma violação dos direitos fundamentais garantidos pela Primeira Emenda da Constituição dos EUA.
O caso ganha contornos ainda mais complexos ao considerar o contexto político brasileiro. No dia anterior à ação judicial, Moraes recebeu da Procuradoria-Geral da República (PGR) uma denúncia contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e outras 33 pessoas, acusados de participar de uma suposta trama golpista para impedir a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Esse cenário tem sido marcado por uma série de decisões polêmicas do ministro, que incluem a suspensão de redes sociais e a remoção de conteúdos considerados desinformação.
Rumble deixa o Brasil
A plataforma Rumble, que se descreve como uma defensora da liberdade de expressão, decidiu encerrar suas operações no Brasil em dezembro de 2023, após uma série de ordens judiciais emitidas por Moraes. Na época, o ministro determinou que a empresa mantivesse sigilo sobre as determinações, sob pena de multas e interrupção de seus serviços no país. A decisão de sair do Brasil foi tomada para evitar sanções financeiras e, segundo a empresa, proteger seus usuários de “censura injusta”.
Em agosto de 2023, Moraes já havia ordenado a suspensão da rede social X (antigo Twitter) no Brasil, após a plataforma se recusar a cumprir determinações de remoção de perfis e postagens. A medida gerou críticas internacionais, incluindo do bilionário Elon Musk, CEO da X, que classificou o ministro como “um ditador tirânico disfarçado de juiz”.
Liberdade de expressão em jogo
A ação judicial movida pelo Rumble e pela empresa de mídia de Trump busca garantir que as empresas americanas não sejam submetidas a ordens judiciais estrangeiras que violem a Constituição dos EUA. O CEO do Rumble, Chris Pavlovski, afirmou que as tentativas de Moraes de silenciar Allan dos Santos nos EUA são uma afronta à liberdade de expressão. “Moraes está tentando contornar completamente o sistema legal americano, utilizando ordens sigilosas de censura para pressionar redes sociais americanas a banir um dissidente político em nível global”, disse Pavlovski.
Allan dos Santos, que reside legalmente nos EUA, teve seu pedido de extradição rejeitado pelo governo Biden em abril de 2023. As autoridades americanas argumentaram que os atos pelos quais ele é acusado no Brasil — suposta disseminação de desinformação — não são considerados crimes nos EUA, onde a liberdade de expressão é protegida pela Primeira Emenda.
Implicações políticas e jurídicas
O processo tem implicações que vão além do âmbito jurídico. A nova administração Trump, que promete proteger a liberdade de expressão das empresas americanas, pode intensificar as tensões com o Brasil. Figuras influentes do governo americano, como Elon Musk, já demonstraram hostilidade em relação a Moraes e ao que consideram um regime de censura crescente no país.
Além de buscar uma decisão que declare as ordens de Moraes ilegais sob a legislação americana, a ação também pede que Apple e Google sejam impedidos de seguir qualquer determinação do ministro de remover os aplicativos do Truth Social e do Rumble de suas lojas virtuais. O caso pode acirrar os conflitos latentes entre os dois países, com possíveis repercussões nas relações diplomáticas e comerciais.
Avaliação
O embate entre o Rumble, a empresa de mídia de Trump e o ministro Alexandre de Moraes coloca em debate questões fundamentais sobre soberania, liberdade de expressão e a jurisdição internacional sobre empresas de tecnologia. Enquanto o Brasil busca coibir a disseminação de desinformação, os EUA defendem o direito à liberdade de expressão como um pilar de sua democracia. O desfecho desse processo pode definir novos parâmetros para a atuação de plataformas digitais em um mundo cada vez mais conectado e polarizado.